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abr 7, 2020

Cinema independente brasileiro
 
O que faz um filme ser considerado independente? Adotando uma perspectiva histórica, Alfredo Suppia e Maria Cristina Couto Melo recuperam parte da trajetória do cinema brasileiro para ensaiar uma resposta à altura da complexidade da pergunta. Neste texto, os dois percorrem das discussões politizadas que antecederam o Cinema Novo às leis de incentivo fiscal que consolidaram a produção audiovisual dos anos 1990 em diante. A discussão é multifacetada. Para os cinemanovistas, a temática nacional e uma estética própria fariam emergir um cinema independente dos padrões estrangeiros. Já no contexto do Cinema da Retomada, critérios operacionais e mercadológicos é que ditariam o grau de independência de um projeto. “O significado do termo ‘cinema independente’, portanto, desliza e se reconforma ao longo de um eixo diacrônico do pensamento cinematográfico brasileiro”, afirmam os pesquisadores. Mais do que definir o termo, Suppia e Melo apontam aspectos que ajudam o leitor a pensar criticamente a produção nacional.

“Transformações do pensamento cinematográfico independente brasileiro:
uma investigação preliminar”

Por Alfredo Suppia e Maria Cristina Couto Melo
Alceu (PUC-Rio)
v. 20, n. 38, 2019


Rainha do Egito
 
No último Carnaval, Alessandra Negrini deu o que falar ao se fantasiar de indígena no desfile do Acadêmicos do Baixo Augusta, em São Paulo. No artigo de Fabio Camarneiro, a atriz também é alvo de escrutínio, mas por sua interpretação de Cleópatra no filme homônimo do diretor Júlio Bressane, lançado em 2007. Aqui, o pesquisador analisa do sotaque ao gestual de Negrini, relacionando sua personificação àquela de Elizabeth Taylor, na clássica versão de 1963, e à de Theda Bara, no filme perdido de 1917. Para Camarneiro, Bressane se utiliza da popularidade da atriz para quebrar expectativas: interessa-se por sua figura televisiva, mas, ao mesmo tempo, rechaça o tom naturalista das interpretações na TV. Além disso, sua análise dá conta de outras estratégias empregadas pelo cineasta, mestre em justapor referências às pinturas do Renascimento e ao humor caricato das chanchadas brasileiras.

“A Cleópatra de Alessandra Negrini: sexo e política no Egito carioca”
Por Fabio Camarneiro
ECO-Pós (UFRJ)
v. 22, n. 1, 2019


Rádio, teatro e serpentina
 
Por falar em chanchadas, a pesquisadora Flávia Cesarino Costa aplica intermidialidade como método historiográfico para analisar os números musicais típicos do gênero. Em tempo: convencionou-se chamar de chanchada comédias brasileiras, realizadas entre os anos 1930 e 1950, fortemente influenciadas pelo rádio, pelo teatro de revista e pela cultura carnavalesca carioca. Ao contrário da maioria dos artigos, no entanto, Costa não tem como foco os filmes em si, mas como o que acontecia fora da tela era crucial para a realização deles. “Nesse sentido, é preciso diminuir a importância do cinema para poder explicá-lo, inserindo seu funcionamento na lógica de um circuito cultural mais amplo”, argumenta. Para ela, os “números musicais estão ligados umbilicalmente às várias práticas extracinematográficas de encenação ligadas à indústria fonográfica, à aparição dos cantores nas rádios e no star system da imprensa e ao carnaval como fato cultural intensamente coberto pelas mídias”.

“Considerações sobre os números musicais das chanchadas”
Por Flávia Cesarino Costa
Significação (USP)
v. 45, n. 50, 2018


Medo real

Para Fernanda Sales Rocha Santos e Cecília Antakly de Mello, o cinema realista contemporâneo é devoto de uma estética sensória, aquela que prioriza fenômenos perceptíveis, sensíveis e experienciais, resultando em uma ampliação espacial e temporal dos eventos filmados. Muitos dos renomados cineastas em atividade, como Gus Van Sant, Lisandro Alonson, Kleber Mendonça Filho e Tsai Ming-liang, trabalhariam em cima dessa estética, segundo as autoras. Neste artigo, a dupla atenta para a relação que pode se estabelecer entre produções realistas e o horror, um gênero marcadamente sensorial. Em sua argumentação, Santos e Mello defendem que “os novos realismos, ao se vincularem com a suspensão da ação dramática em prol de um certo protagonismo dos espaços e dos dispositivos, se vinculam com as tortuosidades e inseguranças epistemológicas do horror e do gótico”.

“Insegurança perceptual e atmosferas do medo: conexões entre realismo e horror no cinema contemporâneo”
Por Fernanda Sales Rocha Santos e Cecília Antakly de Mello
Ícone (UFPE)
v. 17, n. 3, 2019

Jauja (Lisandro Alonso, 2014).

Em tempos de Netflix

A produção de conteúdo para streaming vem crescendo no Brasil, mas e a sua regulação? Como estabelecer normas para, a um só tempo, aquecer o mercado e proteger a indústria nacional? É possível delimitar fronteiras online? São essas difíceis questões que João Martins Ladeira e Leonardo de Marchi decidiram encarar neste texto publicado na Contracampo. “As dúvidas sobre como propor incentivos à produção nacional de audiovisual derivam de uma incerteza dos caminhos para lidar com estes espaços organizados através de tais redes, lidando com forças que incidem sobre um território devido à sua conexão a estruturas móveis de administração”, escrevem. Além de uma preocupação no que toca a tributações e encargos relacionados ao streaming, os autores também parecem interessados em consequências de viés filosófico. Estão de olho nos “efeitos introduzidos por estas redes na reconfiguração do próprio entendimento sobre a realidade, reinventando definições de tempo e espaço”.

“Redes de imbróglios: a regulação do streaming no Brasil e suas ambiguidades”
Por João Martins Ladeira e Leonardo de Marchi
Contracampo (UFF)
v. 38, n. 3, 2019


Publicidade-documentário

De acordo com pesquisa realizada pela TODXS, a representatividade da comunidade LGBTQ na publicidade brasileira foi de 0,33% no segundo semestre de 2017. À parte a porcentagem irrisória, há críticas também à maneira estereotipada como gays, lésbicas, bissexuais e pessoas trans são retratadas. Diante desse quadro, o pesquisador Leonardo Mozdenski resolveu analisar o que ele denomina publicidade sexo-diversa, “expressamente dissidente e contestadora no tocante à heterocoercitividade midiática hegemônica”. Em sua pesquisa, ele discute a representação LGBTQ nos filmes publicitários A mágica de Liniker (2016), Toda mulher vale muito (2016) e Absolutas (2017). Nos três casos, Mozdenski percebe que a linguagem documental é acionada como principal tática: “É justamente essa visada realista do documentário que será apropriada pela publicidade sexo-diversa como estratégia para a construção de uma voz de credibilidade”. Em paralelo, o autor problematiza a apropriação das pautas identitárias pelo neoliberalismo que transforma vidas em mercadorias.

“A publicidade-documentário e a construção discursiva do efeito de real em prol da causa LGBTQ”
Por Leonardo Mozdzenski
Ícone (UFPE)
v. 17, n. 2, 2019


Quem quer dinheiro?

Vice-líder de audiência no Brasil, o SBT é comumente associado a uma certa ideia de cafonice. O pesquisador Rafael Barbosa Fialho Martins mostra, entretanto, que essa associação não é bem um problema para a emissora. Muito pelo contrário, sua análise das vinhetas institucionais evidencia que o canal preza justamente pelo excesso, pelo sentimentalismo e pelas cores vibrantes típicas do que se entende por algo considerado brega. Segundo o autor, esse método tem como objetivo construir uma intimidade com o espectador médio. Assim, enquanto a TV Globo, emissora líder, se destacaria pela qualidade técnica, o SBT investiria em outro tipo de estratégia para consolidar seu público. “Embora pareça apenas uma ‘estética do improviso’ brega e improvisada, o estilo do SBT mostra um posicionamento estético bem pensado e estruturado ao longo dos anos”, defende.

“‘Por que o SBT é tão brega?’: afeto e sentimento na interação da emissora com a audiência”
Por Rafael Barbosa Fialho Martins
Lumina (UFJF)
v. 12, n. 2, 2018


Da pintura à videoinstalação

Definido como um conjunto de vistas justapostas que podem ser visualizadas como uma única imagem envolvendo o espectador, o panorama pintado é uma invenção de 1787. Tornou-se oficial quando Robert Barker patenteou o processo de construção de perspectiva em uma tela circular. Inaugurado dois anos depois em Londres, seguiu popular ao longo de todo o século XIX na Europa. Com a fotografia e, depois, a tecnologia digital, surgiram novas possibilidades de criação e de interação com o público. Neste artigo, Maria Amélia Bulhões estuda a paisagem nas videoinstalações digitais interativas, retomando a análise da experiência dos panoramas pintados como uma forma de recuperar uma tradição perdida. A pesquisadora selecionou Danube Panorama (2005) e Niles Studies (2006), de Michael Aschauer, Figuras na Paisagem (2010), de André Parente, e Place-Ruhr (2000), de Jeffrey Show, para revelar aspectos referentes à tradição dos panoramas pintados na arte contemporânea. Bulhões acredita que panoramas digitais “oferecem formas de abordagem das paisagens até então inimaginadas”.

“Paisagens: panoramas pintados e videoinstalações digitais interativas”
Por Maria Amélia Bulhões
Pós (UFMG)
v. 9, n. 17, 2019

Figuras na Paisagem (André Parente, 2010).